A recomendação é evitar aglomerações e, se possível, não sair de casa. Essas são decisões duras que se fazem necessárias à medida que o surto de coronavírus ganha força no pais.
Mas elas têm afetado a rotina de muitas empresas: restaurantes estão às moscas, lojas de shoppings só levantam as portas por mera formalidade, escritórios tentam tocar suas rotinas com funcionários à distância.
Para sobreviverem a esse período de incertezas e ao mesmo tempo não colocarem seus funcionários em risco, muitas empresas estão antecipando férias, reduzindo jornadas e adotando outras medidas que podem se transformar em outro problema mais à frente.
Segundo o advogado trabalhista Alexandre Gomes Kamegasawa, sócio do escritório Eli Alves da Silva, até que os governos publiquem determinações que possam resguardar medidas emergenciais adotadas pelas empresas, haverá sempre o risco de quebra nas relações trabalhistas.
A prefeitura de São Paulo, por exemplo, determinou que o comércio feche as portas a partir de sexta-feira, 20/03, até nova ordem. Exceções, como restaurantes, terão de adotar medidas preventivas, como espaçamento mínimo entre mesas. Decretos parecidos também foram editados pelos governos de Goiás e Rio de janeiro. Nesses casos, há respaldo para antecipar férias ou reduzir jornadas e salários de funcionários emergencialmente.
Mas em cidades e estados onde há apenas recomendações, diante da insegurança jurídica, Kamegasawa aconselha às empresas a se pautarem pelas regras definidas pela Consolidação das Leis Trabalhistas (CLT).
ANTECIPAÇÃO DE FÉRIAS
Pelas regras, é preciso informar o empregado sobre as férias 30 dias antes de elas serem concedidas. Mas diante dessa crise, não há sentido em seguir a obrigação.
Como não há punição expressa na CLT para quem descumprir essa regra, Kamegasawa acredita que a Justiça do Trabalho irá relevar o não cumprimento do prazo pelas empresas frente a emergência atual.
O advogado recomenda às empresas que, preferencialmente, antecipem as férias do empregado que está com o período aquisitivo mais próximo do vencimento.
“Estou sugerindo aos meus clientes que deem férias a funcionários que estão com período aquisitivo há dois meses do vencimento, isso para não descaracterizar muito a finalidade das férias”, diz Kamegasawa.
As férias, vale lembrar, tem o objetivo de resguardar a saúde do trabalhador com o descanso de 30 dias após 12 meses trabalhados.
“Há uma justificativa de bom senso, em razão da crise mundial, para antecipar as férias dos empregados”, afirma o advogado. “Mas como não há nenhuma determinação, diante dessa insegurança jurídica, a CLT precisa ser uma referência”, completa.
REDUÇÃO DE JORNADA E SALÁRIO
Existe uma previsão legal, trazida pela Lei nº 4923, de 1965, para redução de jornadas e salários dos empregados. Ela diz que, em face da conjuntura econômica, se houver problemas que atinjam o funcionamento da empresa, essas reduções podem ser feitas.
Porém, Kamegasawa lembra que essa decisão dependerá de acordo com os sindicatos das categorias envolvidas. Ou seja, é mais fácil para empresas que possuem bom relacionamento com os representantes de seus funcionários.
Pela lei, os salários podem ser reduzidos em até 25%. “Não é algo simples de se conseguir, há toda a burocracia envolvida no processo de negociação com os sindicatos”, diz o advogado.
Segundo ele, as autoridades brasileiras deveriam adotar medidas para facilitar esse procedimento, como as feitas em Portugal.
Diante do agravamento da pandemia na Europa, o governo português simplificou as regras para o chamado lay-off, mecanismo que permite a suspensão temporária do contrato de trabalho.
Como por aqui não há nenhum decreto simplificando a redução da jornada e salário, as regras estabelecidas pela lei de 1965 precisam ser observadas.
AFASTAMENTO DE FUNCIONÁRIO
Com a edição da Lei 13.979/2020, que criou medidas de combate à propagação do coronavírus, como o isolamento e a quarentena, o afastamento de um funcionário que se enquadra nessas situações será considerado falta justificada.
Nesse caso, o empregado não terá o dia descontado e, segundo juristas, a empresa terá de pagar o seu salário durante todo o período de afastamento.
Em outra situação, se o trabalhador precisar ser afastado por recomendação médica, sem necessariamente ser obrigado a isso pela Lei 13.979, nos primeiros 15 dias do afastamento o salário será pago pela empresa e no período seguinte, passará a receber o auxílio-doença do INSS.
Diante dos problemas que se avizinham, muitas empresas podem pensar em demitir os funcionários. Claro que cada empresário sabe onde a crise aperta mais, mas a recomendação de Kamegasawa é que isso não seja feito sem critério.
“Toda demissão tem um custo, e não há como saber quanto tempo vai demorar essa crise. Se durar pouco, o funcionário demitido pode fazer falta”, diz o advogado.